Hoje falo sobre “A Mão Esquerda da Escuridão”, de Ursula Le Guin.

Estou para ler algo desta autora há muito tempo já. Esperei uma promoção na Amazon para poder ler o que muitos consideram sua obra mais importante. “A Mão Esquerda da Escuridão” é um livro impactante e, sem dúvida alguma, merece ser lido, ainda mais nos tempos de hoje.

O livro trata das (des)venturas de Genly Ai, um enviado do Ekumen (espécie de Império Galático do Isaac Asimov) que está em Gethen, também conhecido como o planeta Inverno. Esta confusão de nomes logo no início desta resenha já mostra que o livro não é muito fácil de ler no começo. Ao longo, a experiência fica menos pesarosa, mas exige atenção do leitor.

Em Gethen, Genly Ai tem a missão de convencer o planeta a se juntar ao Ekumen. O cerne da história, porém, reside num detalhe interessante sobre os habitantes de Gethen: eles não tem gênero definido. Todos os Gethenianos são assexuados durante todo o tempo em que não estão no kemmer (uma espécie de cio). Durante este período reprodutivo eles podem assumir uma faceta masculina ou feminina. Quando assumem a feminina, podem engravidar e permanecer femininos durante a gestação. Isso criou uma sociedade igualitária em termos de gênero na qual não há violência sexual ou intrigas por interesse sexual. A criação das crianças é obrigação de todos.

Estas reflexões sobre gênero e sexualidade estão diluídas ao longo de uma série de intrigas e aventuras do personagem principal em sua missão de “recrutar” Gethen a participar de uma sociedade interplanetária.

Apadrinhado, ainda que indiretamente, por Estraven, primeiro-ministro de um dos reinos de Gethen, Genly aprende muito sobre a cultura do local e como as características de seus habitantes os ajudam a sobreviver num planeta inóspito no qual a temperatura raramente passa dos 0ºC. Aos poucos, Genly se vê obrigado a colaborar com pessoas que não conhece e não confia para cumprir sua missão, tendo sua própria humanidade colocada à prova.

OPINIÃO: “A Mão Esquerda da Escuridão” traz uma reflexão interessantíssima sobre diversidade de gênero, sexualidade e polarização. Para o leitor, a sensação que fica é que nossos paradigmas foram quebrados aos poucos durante a leitura, com muita classe.

A história, em si, é interessante e move a trama. Mas eu, pelo menos, fiquei muito mais interessado na construção do mundo de Gethen e sua população do que na trama per si. Ursula Le Guin trabalha o texto de uma forma que você se sente descobrindo algo novo a cada capítulo, como uma recompensa.

Porém, a linguagem do livro não é das mais simples. Por vezes a leitura se assemelha mais a um estudo científico do que a literatura de ficção e isto pode cansar alguns leitores que buscam uma leitura mais simples e agradável. Eu era um desses leitores e, por isso, o livro só foi me cativar lá perto da metade. De início, insisti na leitura por saber que trazia uma discussão interessante e, no fim, não me arrependi.

Pretendo ler outras obras desta autora, ainda mais agora sabendo o tipo de linguagem que me espera. Este livro vale muito pela reflexão que traz e, para os que se interessam por uma ficção asimoviana como Fundação, a história geo-política de Gethen também é bastante cativante.

Leitura recomendada, ainda mais em tempos de intolerância, como os nossos.

NOTA PARA A LEITURA: 8/10

Por Rafael D’Abruzzo